sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Cuidados paliativos

Ela Saia de casa todos os dias antes do sol raiar, enfrentava uma longa estrada de barro fofo, pedras pontiagudas e passava por um corredor de cactos com espinhos enrijecidos e  aparentes .
  Ao longo do ano letivo , fôra perdendo um chinelo aqui, outro acolá, a blusa já bastante desgastada pelo uso, agarrou em um prego preso próximo a porta da escola e se rasgou.
A calça jeans apertada que herdou de aluno um pouco menos favorecido corporalmente, não mais suportava o corpo que a vestia.
Uma troca de professores, o aumento do inverno, e seguia ela, valente , cabeça erguida, em busca da evolução.
Arrumava os poucos cabelos que lhe sobraram após a última epidemia de piolhos na escola da região, e seguia firme para mais um dia de aula.
O corpo cansado ,já não lhe permitia longas caminhadas, o que a fez procurar abrigo em uma cidade um pouco mais próxima. Deixando ela longe do seu lar.
Mas a sede de aprender lhe fazia levantar todos os dias, esticar as pernas finas dentro da calça poida , com atenção para desviar dos buracos da mesma e direcionar os pés para a boca de saída.
Após ter a mochila Roubada por um larápio, Carregava os livros na sacola do mercado, e mantinha o Sorriso nos lábios.
Corria  o longo trajeto de 7 vezes 7 mil léguas morro acima.
Pouco tempo para o estudo , falta de familiaridade com a nova professora, que abraçou diversas turmas , deixando de lado a individualidade de cada aluno , apesar do seu alto grau de instrução....
Sendo assim, mesmo com toda sua dedicação,e afinco, passou a ter dificuldades  em algumas matérias.
A menina guerreira seguia firme , com  o mesmo sorriso largo nos lábios rachados pelo sol.
O inverno se intensificava, o frio gelado doía em seus ossos recorbertos apenas pela fina camada do pano da camiseta poída , a calça rota, e os pés de casca grossa apoiados no chão.

Informam a família da cidade distante, que apesar de todos os esforços, aquele ano letivo já estava perdido. Que não havia mais o que fazer.
Uma certa tarde, ao soar o sinal de saída, a professora lhe pede que aguarde na carteira alguns minutos enquanto os outros alunos se vão.
Senta a sua frente com  com ar de superioridade,  diretor ao lado , diploma de cátedra experiente e põe a sua frente uma cartilha explicando o  caso:
- Olha , você já está reprovada, pode se dedicar o quanto for, pedir ajuda aos familiares, mas nada mudará o fato.

Você pode continuar vindo as aulas, vai levar lições para casa, mas preciso te avisar que é possível que a escola passe por uma reforma. Terá uma pequena goteira bem em cima da sua carteira, mas , caso você prefira, podemos substituir a água por farinha de trigo, de rosca, leite em pó desnatado ou integral, grãos de linhaça ou uma  deliciosa pasta de berinjela apimentada que preparamos ano passado.
A carteira escolar está com uma das pernas quebradas, mas se você se mantiver inclinada a 145 graus ao norte , vai conseguir ler as coisas que a professora escreve atrás da viga de sustentação que será colocada a sua frente.
Ao findar das explicações, esticam o braço, ajeitam a gravata de seda sob o terno de linho com corte francês, entregam a cartilha bem desenhada, um aperto de mão e finalizam: -  Mas de brinde , como somos generosos,  você poderá escolher se quer fazer a prova final ou não.
Ela põe a cartilha em baixo do braço, entrega a seus familiares  que dias depois recebem um telefonema.
Bom dia ! A menina parece desmotivada nas aulas, sabe explicar o que aconteceu?