quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Coração Cansado

Ele andava por ai... Pés descalços , cascudos, cheios de cicatrizes e machucados feitos pelas pedras do caminho ...  cabelos emaranhados, aquela velha roupa um dia vistosa, agora rota e encardida, pequenos furos surgidos com o tempo, uso e desgaste.
 Uma marca de suor aqui, um fio puxado ali, alguns vincos, manchas, marcas de caneta, um queimado de cigarro...
Em dias de festa , punha seu melhor sorriso, escovava bem os dentes, gargarejava enxaguante bucal, uma bela maquiagem nos olhos, casaco cor de fogo abotoado até o nó que lhe apertava a garganta. 
Engolia a seco, molhado ou do jeito que vinha. 
Possuía um vidro de pimenta no bolso , e tudo lhes parecia mais saboroso.
Não saia jamais sem os óculos com vista para seu mundo colorido. Salvo vez ou outra  , que o mesmo era esquecido em cima das notas do piano de cauda marrom...
Nesses dias , não entendia o mundo, as pessoas, as cores acinzentadas ou em tons pasteis. 
 Um liquido agridoce escorria de seus olhos , tentando limpar aquela cor embaçada, aquele gosto amargo da boca, um tom gelado na guela, um som rascante no peito, uma prisão ao respirar, uma falta de ar, de par, de lar, de imensidão do mar...
Um excesso de incompreensão, de silêncio,  de falta de respeito, de medo, de angústia, de mentiras, de descaso, de egoísmo, de falsidade, de sorrisos amarelos, um cheiro verde de gosma, um tom acobreado de passado, um som estridente de guerra, um cheiro de ódio, disputa , magoa, terror...
E sua capa de super herói, aposentada de um lado, seus  olhos fechados por dentro, choravam com as mãos no rosto. 
Carrapetas desgastadas pelo tempo, pelo vento, pelo excesso de uso...  Comportas arrebentadas pela quantidade de água rolada, pela força dos ventos... 
E as lágrimas , já vinham sem controle, sem pedir licença,  lavando a cara, o corpo, a alma...A carne marcada, o sorriso enjaulado, o coração vazio e lotado por dentro, apertado de tanto sentimento com pouco uso.
E como um maremoto  sangüíneo , o sangue forçava a pele, que gritava , alongava, e no fim... continha...
Ele , respirava com força, se apoiava na mesinha de cabeceira ao lado da cama, ...caminhava até o espelho, se olhava fundo nos olhos ainda vermelhos e úmidos, ouvia , e sentia os soluços que doiam no fundo da garganta...
Passava as mãos pelos cabelos desalinhados... Abotoava seu olhar de caça... Pendurava as sobrancelhas um pouco mais alto... Batia 3 socos no peito , feito um orangotango  em tempos de acasalamento... 
Alargava as costas, erguia a cabeça, amarrava a ponta dos lábios nas orelhas, punha suas lentes de contato pessoal, guardava aquele que pulsava,  em outra caixa no bolso interno do casaco... 
E saia , sem ser notado por dentro, desfilando,  a rasa imagem de fora.